Em meio a tanta informação, como saber o que é essencial?
- Célia Chueire
- 12 de jun. de 2022
- 3 min de leitura

Sabiamente alguém já disse: o principal é manter o principal como principal!
Uma patologia do nosso tempo é a ausência de foco, onde tudo é urgente, há um frenesi pelo domínio do conhecimento e do protagonismo.
Entre numa livraria qualquer num shopping e perceba como se mexem suas entranhas junto às gôndolas e prateleiras com livros oferecendo sucesso, vitórias em tempo rápido, uma quantidade infindável de livros do tipo HOW TO obter alguma coisa. Parece que diante do desgaste do imediatismo, até o vocabulário mais chulo já faz parte dos títulos das novas obras.
Diante do tsunami de literatura e informação digital, o que de fato, é necessário? Duvida que seja assim? Dá uma olhadinha na sua caixa de e-mail, e veja a quantidade infindável de propostas, ofertas, de velhas novas iniciativas mercadológicas que estressam o dono do e-mail. Aliás, só no consumo do meio digital e no consumo de drogas é que a pessoa é chamada de usuária. Deve mesmo ter alguma semelhança entre ambas, essa capacidade viciante e paralisante, de provocar algum êxtase momentâneo, senso de realização e de grandeza, para pouco depois descobrir que deu em nada, e o que é pior, descobre-se que já não se consegue sair dessa cracolândia virtual.
Tornamos cada um de nós o famoso desconhecido. Mesmo quando rabisco essas singelas linhas reforço esse comportamento, meu e seu. Será que o que se lê aqui acrescenta algo de verdadeiro, de consistente e de esperança na sua vida? É mesmo essencial ler o que está lendo? Seria, no mínimo, algo cínico, falar dos outros e não me incluir nessa tempestade de notícias.
Um amigo jornalista me disse que em épocas de estudante na última década do século XX quando ainda estava deslumbrado com o poder da comunicação e cria piamente ter encontrado a solução da paz para o mundo, um dos seus professores, no intuito nobre de ensiná-los a buscar a boa notícia, dizia que quem quisesse mesmo ser jornalista deveria, todos os dias, ler uns cinco jornais antes do café-da-manhã. Nessa época sequer se mencionava internet em que qualquer reles mortal tem acesso a qualquer coisa e fato, em qualquer idioma e em qualquer hora. Só não avisaram que junto do pacote viria a síndrome de querer saber tudo, e no fundo não saber nada. Pouco de tudo e nada de profundo.
Será que tornamo-nos todos ou a maioria, sábios da profundidade um pires? É verdade, os tempos são outros. São outros e seus efeitos também.
Em 2019, a neurocientista americana Maryanne Wolf, professora pesquisadora da Universidade da Califórnia lançou seu livro de 256 páginas O cérebro no mundo digital: os desafios de nossa era, no qual mostra os efeitos da tecnologia na nossa capacidade de leitura e de retenção. Lê-se qualquer coisa, numa vista d`olhos qualquer assunto, e o que é que fica mesmo? Ela não demoniza a tecnologia, mas não perdoa os efeitos. Bem, leia o livro e descubra as consequências.
A pergunta que se faz não é se sabemos bem alguma coisa, mas se sabemos nos conformar ao mundo que nos rodeia com o pouco que sabemos. Passa por aí o conceito de Modernidade Líquida cunhado pelo sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman, angustiado sobre a qualidade das relações humanas nessa tardia Pós-Modernidade. Faleceu em 2017 deixando mais de 30 obras, ainda que nunca tenha deixado suas convicções marxistas que colocariam sob suspeita suas análises, mas foi quem conseguiu traduzir esse tempo em que vivemos em pelo menos três livros: o medo líquido, o amor líquido e a modernidade líquida. Ou seja, tudo passa pelos dedos, toma a forma de onde estiver, não há referências. Então para que saber ou deter um conhecimento absoluto sobre qualquer coisa?
Há uma geração que certamente sofrerá urticárias mentais para lidar com esse fenômeno, enquanto a atual e imersa no mundo virtual, já terá essa conformação meio que geléica. A coisa é assim: dá uma goolgada, capte o que precisa e toca o barco.
Essencial mesmo é o que se precisa no momento, nada é absoluto, tudo é relativo e líquido. Durma-se com um barulho desses!
Seja qual for a fonte de informação ainda defendo a máxima: o principal é manter o principal como principal.
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